terça-feira, 24 de abril de 2012

UMA RETIRADA SEM GLÓRIA E SEM HONRA


Mais uma vez, os Estados Unidos concluem uma guerra sem ganhá-la, ao não conseguir impor sua plena vontade aos agredidos. Os soldadosnorte-americanos não saem do Iraque como saíram de Saigon, em 30 de abril de1975, escorraçados pelas tropas de Hanói e pelos vietcongs. Desta vez, elesprimeiro arrasaram o Iraque, durante uma década de bombardeios constantes.

O despotismo de Saddam não incomodava antes os EstadosUnidos, quando coincidia com o interesse de Washington. Tanto era assim, que osnorte-americanos estimularam a guerra contra o Irã, e lhe ofereceram suportebélico e diplomático, mas seu objetivo era o de debilitar os dois países. Nomomento em que — cometendo erro político elementar — Saddam pretendeu restauraras fronteiras históricas do Iraque, ao invadir o Kueit, Washington encontrou,com o primeiro Bush, o pretexto para a agressão aérea a Bagdad, a criação dachamada zona de exclusão, em que o bombardeio aéreo era indiscriminado, e obloqueio econômico.

Foram dezenas de milhares de mortos durante os dez anosde ataques aéreos, prévios à invasão. Entre os sobreviventes da agressão, houvemilhares de crianças, acometidas de leucemia pela radiação das muniçõesamalgamadas com urânio empobrecido.

Assim, ao invadir o país por terra, os americanosencontraram um exército debilitado, parte do território arrasado e um governona defensiva diplomática. O pretexto, que os fatos desmoralizaram, era o de queSaddam Hussein dispunha de armas de destruição em massa.


Ontem, o presidente Obama disse que o Iraque é hoje um“país independente, livre e soberano, muito melhor do que era com Saddam”.Saddam, sabem os observadores internacionais, era muito menos obscurantista doque os príncipes da Arábia Saudita.

Seu povo vivia relativamente bem, suas mulheres não eramtratadas com desrespeito e frequentavam a universidade. Algumas ocupavam cargosimportantes no governo, na vida acadêmica e nos laboratórios de pesquisas.Havia tolerância religiosa, não obstante a divergência secular entre os sunitase os xiitas, que ele conseguia administrar, a fim de assegurar a paz interna.

O vice-primeiro-ministro Tarik Aziz era católico, do ritocaldeu. País de cultura islâmica, sim, mas talvez o mais aberto de todos eles aoutras culturas e costumes. O país se encontrava em pleno desenvolvimentoeconômico, com grandes obras de infraestrutura, e mantinha excelentes relaçõescom o Brasil, mediante a troca de petróleo por tecnologia e serviços deengenharia, quando começaram os bombardeios.

Depois disso, nos últimos nove anos, a ocupaçãonorte-americana causou a morte de mais de 100 mil civis, 20 mil soldadosiraquianos e 4.800 militares invasores, dos quais 4.500 ianques. Milhares emilhares de cidadãos iraquianos ficaram feridos, bem como soldados invasores, amaioria deles mutilados. As cidades foram arrasadas — mas se dividiram os poçosde petróleo entre as empresas dos países que participaram da coligação militarinvasora.


Hoje não há quem desconheça as verdadeiras razões daguerra, tanto contra o Iraque, quanto contra o Afeganistão: a necessidade dosuprimento de petróleo e gás, do Oriente Médio e do Vale do Cáspio, aos EstadosUnidos e à Europa Ocidental. Daí a guerra preemptiva e sem limites, declaradapelo segundo Bush, que se dizia chamado por Deus a fim de ir ao Iraque matarSaddam Hussein. Não só os mortos ficam da agressão ao Iraque. Os americanossaem do país, deixando-o sem energia elétrica suficiente, sem água potável, com15% de desempregados e, 85% dos que trabalham estão a serviço do governo.

Toda a história dos Estados Unidos — ao lado de méritosfantásticos de seu povo — foi construída no afã da conquista e da morte. Desde aocupação da Nova Inglaterra, não só os índios conheceram a sua fúriaexpansionista: na guerra contra o México, o país vencido perdeu a metade doterritório pátrio, o que corresponde a quase um terço do atual espaçonorte-americano no continente.

Uma das desgraças da vitória americana foi a ruptura doCompromisso do Missouri, com a ampliação do escravagismo aos novos territórios,que seria — pouco mais de dez anos depois — uma das causas do grande confrontointerno, entre o Sul e o Norte, a Guerra da Secessão. Lincoln, que a enfrentou,havia sido, em 1847, um dos poucos a se opor ao conflito contra o México.


A partir de então, a ânsia imperialista dos EstadosUnidos não teve limites. Suas elites dirigentes e seus governantes, salvoalguns poucos homens lúcidos, moveram-se convencidos de que cabia a Washingtondominar o mundo. Ainda se movem nessa fanática determinação. Agora, saem doIraque e anunciam que deixarão também o Afeganistão, no ano que vem. Mas, aomesmo tempo, dentro da doutrina Bush da guerra sem fim, preparam-se para novaagressão genocida contra o Irã.

Os Estados Unidos nunca conheceram a presença deinvasores estrangeiros. Sua guerra da independência se fez contra tropasbritânicas, que não eram invasoras, mas sim ocupantes da metrópole na colônia.As poucas incursões mexicanas na fronteira, de tão frágeis, não contam. Mas háuma força que cresce, e que não poderão derrotar: a do próprio povonorte-americano, cansado de suportar o imperialismo interno de seus banqueirose das poucas famílias bilionárias que se nutrem da desigualdade.

O povo, mais do que tudo, se sente exaurido do tributo desangue que, a cada geração, é obrigado a oferecer, nas guerras sem glória, contrapovos inermes e quase sempre pacíficos, em nome disso ou daquilo, mas sempreprovocadas pelos interesses dos saqueadores das riquezas alheias.


A situação tomou rumo novo, a partir dos anos 80, comoapontou, em artigo publicado ontem por El Pais, o biólogo e filósofo catalãoFederico Mayor Zaragoza, ex-ministro da Educação de seu país e, durante 12anos, diretor-geral da Unesco. A aliança de interesses entre Reagan e MargarethThatcher significou a capitulação do Estado diante do mercado, e se iniciou aera do verdadeiro terror, com 4 bilhões de dólares gastos a cada dia, emarmamentos e outras despesas militares, e, a cada dia, 60 mil pessoas mortas defome no mundo.

Mayor lembra a que levou o novo credo das elites, queCelso Furtado chamou de “fundamentalismo mercantil”: a melancólica erosão daONU e sua substituição por grupos plutocráticos, como o grupo dos 7, dos 8 e,agora, sob a pressão dos emergentes, dos 20. E na pátria da nova fé nas “razõesdo mercado”, os Estados Unidos, há hoje 20 milhões de desempregados, 40 milhõesde novos pobres e 50 milhões de pessoas sem qualquer seguro de saúde.

A Europa assediada e perplexa, com a falência de suasinstituições políticas, está presa na armadilha do euro, que não tem comoconcorrer com o dólar nem com o yuan, porque yuan e o dólar são emitidos deacordo com a necessidade dos Estados Unidos e da China. Disso conseguiu escapara Inglaterra, que mantém a sua moeda própria.

Os Estados Unidos, se não houver a reação, esperada, deseu povo, se preparam para manter o terror no mundo, mediante suas armaseletrônicas de alcance global, entre elas os aviões não tripulados. Seudestino, se assim ocorrer, será o do atirador solitário, que se compraz emassassinar os inocentes à distância, até que alguém consiga, com o mesmométodo, abatê-lo. E não faltam os que se preparam para isso.

Este texto foi puiblicado também nos seguintes sites:

http://www.jb.com.br/coisas-da-politica/noticias/2011/12/16/uma-retirada-sem-gloria-e-sem-honra/

http://english.pravda.ru/hotspots/crimes/20-12-2011/120017-A_withdrawal_without_glory_or_honor-0/

http://www.viomundo.com.br/politica/mauro-santayana-uma-retirada-sem-gloria-e-sem-honra.html

http://www.rededemocratica.org/index.php?option=com_k2&view=item&id=1006:uma-retirada-sem-gl%C3%B3ria-nem-honra

http://bbs.chinadaily.com.cn/thread-723738-1-1.html

http://english.pravda.ru/archive/2011-12-20/

http://www.buzzbox.com/news/2011-12-19/iraq:saigon/?clusterId=7321725

http://www.mynewsreader.com/9903/hanoi/#2559680

http://radiocirandeira.wordpress.com/2011/12/19/iraque-uma-retirada-sem-gloria-e-sem-honra/#comment-157

http://correiodobrasil.com.br/iraque-uma-retirada-sem-gloria-e-sem-honra-2/344161/

http://www.correioprogressista.com.br/cache/72997

http://rodolfovasconcellos.blogspot.com/2011/12/eua-deixam-para-tras-um-iraque-arrasado.html

http://www.colunaonline.com.br/coluna_ler.asp?id=5902

http://www.tribunadaimprensa.com.br/?p=28182

http://www.formadoresdeopiniao.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=15366:uma-retirada-sem-gloria-e-sem-honra&catid=77:politica-economia-e-direito&Itemid=132

http://www.riplastel.com.br/blog/

http://bloganacletoboaventura.blogspot.com/2011/12/politica-internacional-e-economia.html

http://www.ujccuritiba.info/2011/12/uma-retirada-sem-gloria-nem-honra.html

http://minutonoticias.com.br/iraque-uma-retirada-sem-gloria-e-sem-honra

http://contacto-latino.com/news/2864391/uma-retirada-sem-gloria-e-sem-honra-jornal-do-brasil/

http://www.patrialatina.com.br/editorias.php?idprog=6ce1861d265248f9c9dd2ed2f88dbdf9&cod=9116

http://guerrilheirodoentardecer.blogspot.com/2011/12/mauro-santayana-uma-retirada-sem-gloria.html

http://josecarlosalexandre.blogspot.com/2011/12/uma-retirada-sem-gloria-nem-honra.html

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