quarta-feira, 18 de julho de 2012

A FRUSTRADA DESFORRA PAULISTA E O DESENVOLVIMENTO DO BRASIL


Todos os historiadores deveriam partir da advertência de Spinoza e buscar entender a realidade, antes de exercer a lisonja ou o ódio. Há oitenta anos, os paulistas se levantavam contra o governo Vargas, sob a bandeira da constitucionalização do país. Ora, o pretexto era frágil, uma vez que, em 14 de maio – três meses antes dessa insurreição armada – o governo provisório emitira o Decreto 21.402, nomeando comissão de juristas, encarregada de elaborar anteprojeto de Constituição e marcando a data de 3 de maio do ano seguinte para a eleição dos delegados constituintes. O prazo de um ano era razoável, porque os membros da comissão necessitavam de tempo hábil para discutir a nova ordem jurídica, depois da ruptura da Revolução de 30.

Não era bem a falta de uma Constituição que estimulara São Paulo à rebelião, que vinha sendo preparada desde a vitória militar da Revolução Liberal, em 3 de outubro de 1930. O que açulava os paulistas era a desejada revanche contra a sua derrota. As elites de São Paulo, todas vindas das oligarquias rurais, não podiam engolir a capitulação militar de Washington Luís diante de tropas mineiras, nordestinas e gaúchas. Os altos quatrocentões, apoiados por vitoriosos imigrantes, que também viviam da exportação de café, sentiam-se como junkers prussianos, acossados pela ralé de bárbaros. Apesar do relativo desenvolvimento da indústria manufatureira, promovido pelos imigrantes, as oligarquias rurais não queriam o desenvolvimento industrial do país, que as deslocaria de seu poder secular.

O sentimento de superioridade, que levara Washington Luís a insistir na continuidade de São Paulo no comando da República, induzira muitos dos chefes do movimento a pensar na independência do Estado, se sua hegemonia econômica não se confirmasse no comando político do país. Essa era uma das razões, mas havia outras, e mais importantes.

A ruptura da República Velha não fora simples mudança de homens ou de partidos no poder, e muito menos coligação de estados pobres, ressentidos contra a pujança econômica de São Paulo. Getúlio, na plataforma da Aliança Liberal, lida em janeiro de 1930, na Esplanada do Castelo, fora claro. O Brasil não poderia continuar um país vazio, só ocupado, desde o descobrimento, no litoral e em escassas manchas humanas no resto do território. A Guerra do Paraguai já nos alertara para a necessidade do intensivo povoamento do Centro-Oeste. O Brasil precisava sair do casulo conservador e dar empregos e vida digna a seu povo.

O confronto se fazia entre o pensamento renovador e a reação conservadora. Tanto é assim que, em Minas, o partido dos aliados das oligarquias paulistas se identificava, sem embuços, como sendo a Concentração Conservadora. Nomes importantes de Minas, conduzidos por motivos diferentes, estiveram com São Paulo, não só em 30, como em 32, entre outros Artur Bernardes e Fernando Mello Viana. E no Rio Grande do Sul, também. No caso, mesclavam-se os interesses pessoais e as questões políticas internas.

Tanto foi assim que os primeiros tiros da Revolução de 30 foram disparados em 6 de fevereiro de 1930, em Montes Claros – terra de Darci Ribeiro, é bom anotar. O tiroteio começou quando uma caravana conservadora, chefiada pelo então vice-presidente da República, o mineiro Mello Viana, passou diante da casa de João Alves e sua mulher, dona Tiburtina, e houve os disparos. A versão mais conhecida é a de que o primeiro tiro partiu do grupo provocador, e foi respondido pelos partidários da Aliança Liberal, que se encontravam no sobrado. Ali morreram seis pessoas e Mello Viana escapou por pouco – uma bala atingiu-lhe levemente o pescoço.

Getúlio pretendia a industrialização do país e justiça social para com os trabalhadores. O mundo começava a mudar, depois da Revolução de Outubro, na Rússia, e os desafios da Depressão iniciada meses antes, com a queda da Bolsa em Nova Iorque. Em 1930, no governo do Estado de Nova Iorque, Roosevelt iniciaria a sua política social e econômica que o levaria em 1932, à presidência e ao New Deal. Roosevelt e Getúlio estavam na mesma estrada. Em contraponto à política de solidariedade para com os trabalhadores, Washington Luís definia a sua posição, ao afirmar que “a questão social é apenas um caso de polícia”.

Infelizmente, ao que parece, os oligarcas paulistas – e seus representantes na política atual – não entenderam até hoje as razões dos revolucionários de 30. Continuam com a mesma posição que tiveram em julho de 1932. O ódio contra Getúlio e o seu governo - que, pela primeira vez via o povo como protagonista da História - permanece até hoje. Não há, em São Paulo, uma ruela qualquer com o nome do grande presidente. Não é por mero exercício retórico que Fernando Henrique Cardoso decretou, sem consegui-lo, “o fim da era Vargas”. Foi por convicção.

Não fazemos a apologia de 1932, nem lhe temos ódio, mas procuramos entender o movimento dos revolucionários paulistas como um gesto que, tendo sido de arrogância contra o Brasil (não nos esqueçamos de seu lema, non dvcor, dvco), foi importante para o desenvolvimento político e econômico do nosso país. Sem seu movimento, não teríamos a consolidação revolucionária do governo provisório, nem o projeto nacional de Vargas, que promoveu a industrialização do país, a participação do Brasil na Guerra e o fim do mito conformista de que deveríamos ser sempre um país essencialmente agrícola, eterno exportador de café e açúcar.

Ora, São Paulo foi o Estado mais beneficiado com a política industrial de Vargas. Como disse Delfim Neto ao jornalista Leonardo Attuch, São Paulo não perdoa a Getúlio o bem que ele fez a São Paulo.

E como a História é feita pelos homens e para os homens, não teríamos, sem a guerra paulista, tido a carreira política de Juscelino, que, sucedendo a Vargas, deu o grande salto para a afirmação do Brasil no mundo. Como se sabe, foi combatendo os paulistas, no Túnel da Mantiqueira, que o capitão médico se tornou político.

E tampouco nos devemos esquecer que os paulistas, derrotados em 32, afinal, ganharam, em 64, quando muitos de seus empresários, reunidos no IEPES, aliaram-se aos militares para derrubar Jango. Eles se mantiveram no poder, diretamente ou pelos seus delegados, até a restauração democrática de 1985.

Quando a repressão se exacerbou em São Paulo - e foi exercida pelo Doi-Codi e pela Oban (Operação Bandeirantes), financiada por grande parte daquele grupo de empresários – muitos dos que tombaram não tiveram o privilégio de cair em pleno combate, como o tiveram os mortos em 30 e em 32. Só Deus e os torturadores sabem como eles pereceram.

O povo paulista começa a desvincular-se das elites, e a autonomia de sua ação política, na solidariedade com os brasileiros de todas as regiões, é a argamassa necessária à autêntica coesão nacional.

OS BANDIDOS E A POLÍTICA


(CM) - Em um de seus melhores ensaios sobre Política e Criminalidade (Politik und Verbrechen), o pensador contemporâneo Hans Magnus Enzensberger, conta que Al Capone, em 1930, chegara a seu apogeu, sem que fosse incomodado pelas instituições do Estado. Ao contrário, eram notórias suas relações com os políticos, com a polícia e com os jornalistas, e todos cultivavam o seu poder e se nutriam de seu dinheiro.

Era um mito ou, como melhor explica Enzensberger, um paramito, criação dos tempos modernos, que não passam de uma miragem dos tempos realmente heróicos, nos quais os mitos nasceram. Os turistas pagavam para, de ônibus, percorrer os bairros em que a quadrilha de Scarface exercia, de fato, o poder de estado, sob o olhar indiferente dos moradores e de seus asseclas – da mesma forma que os visitantes, com a permissão dos narcotraficantes de hoje, passeiam pelas favelas cariocas.

Nesse ano de 1930, segundo as fontes do escritor alemão, a Warner Bros, que crescera com os mitos que criava e vendia, ofereceu uma fortuna a Al Capone para que, em um filme sobre o gangster, interpretasse o próprio Al Capone, o que ele recusou. O criminoso novaiorquino, que se transferira para Chicago aos 20 anos, fizera fulgurante carreira e, aos 30 já reunira cem milhões de dólares daquele tempo - uma quantia equivalente a muito mais de três bilhões de dólares em nossos dias. Tal como em nosso tempo, com o neoliberalismo, a globalização liberal dos anos 30 criara a crise de confiabilidade na moeda e nas instituições políticas. Só Roosevelt, com o New Deal, restabeleceria a confiança no Estado.

Al Capone queria ser o homem mais rico e mais poderoso dos Estados Unidos. Como se sabe, um ano depois a Justiça pegou Capone, porque não pagava imposto de renda. Condenado a 11 anos, transferido para um hospital, acometido de demência provocada pela sífilis, Capone morreu aos 48 anos, em uma propriedade sua na Flórida. Já naquele tempo, havia laranjas, e com a doença do gangster, a maior parte de sua imensa fortuna se distribuiu, naturalmente, entre os prepostos. Os que lhe mantiveram fidelidade garantiram o seu bem-estar possível, mesmo na demência, até o fim.

A criminalidade se exerce em todos os setores da sociedade, e um de seus objetivos é o controle ilegítimo das instituições do estado. A elas podem chegar, mediante a compra de votos e outros recursos, ou controlando alguns políticos mediante o suborno, a corrupção. Os políticos, quando honrados, buscam conquistar o mando mediante a confiança dos cidadãos, e se dedicam a promover o bem comum. Os criminosos se preocupam em construir o seu poder mediante os meios conhecidos, entre eles os da violência sem limites. Um traço comum aos chefes de gangsters é o da “generosidade”. Os defensores de Cachoeira, a começar pela mulher, dizem que ele está sempre disposto a ajudar os outros. Desde, é claro, que os outros o obedeçam. Capone se considerava o grande benfeitor de Chicago, oferecendo dinheiro para iniciativas sociais e obras de caridade.

É o que estamos constatando mais uma vez, nas relações de Carlos Cachoeira com parlamentares e personalidades do poder executivo. São tantas as evidências que não é arriscado identificar, no empresário goiano, o epicentro de uma vasta rede de jogos ilícitos e de assalto aos bens públicos, com a prática de corrupção política, e, talvez, de delitos mais graves. A ministra Carmem Lúcia teve um momento de desabafo ao se referir à Lei da Ficha Limpa: ninguém suporta mais tanta corrupção.

Os senadores respiraram, aliviados, a decapitação de Demóstenes Torres. Provavelmente, alguns dos que comemoraram o sacrifício do bode expiatório estejam sendo precipitados. Estamos no início de uma revolução de caráter ético, bem diferente de outras do passado. A Revolução Francesa foi o resultado da circulação de mais de duzentos jornais em Paris e nas províncias. Hoje, com a internet, cada um de nós pode ser, ao mesmo tempo, jornalista, impressor e distribuidor de informações e opinião. Ainda que a rede esteja sendo usada pelos centros internacionais de poder, a fim de semear a discórdia e impor a sua vontade, a ação coordenada dos cidadãos pode vencer a batalha da informação.

Como nos ensina a dialética, a quantidade faz a qualidade.


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