sábado, 8 de outubro de 2011

A TECNOLOGIA, A ARTE E A POLÍTICA

A carreira extraordinária de Steve Jobs suscita algumas reflexões sobre as relações entre a tecnologia e a criatividade da arte no mundo contemporâneo. Ao contrário de seu grande competidor Bill Gates, que freqüentou a universidade durante algum tempo, ele foi autodidata, mas teve, como nenhum outro empreendedor no campo da informática, o impulso criativo e estético que contribuiu para a universalização do uso dos computadores. Quando a arte se associa à ciência, a tecnologia se desenvolve com maior velocidade, porque é da natureza humana combinar a utilidade com a beleza.

As comunicações eletrônicas – como todas as conquistas da ciência – são o resultado de um longo percurso da inteligência na História. Provavelmente, conforme os registros disponíveis, elas tenham surgido da combinação de duas descobertas que se completam. A primeira, a da eletricidade estática, quando a fricção de um pedaço de âmbar fez com que o material atraísse partículas leves, como fiapos de algodão. O vocábulo grego para âmbar, elétron, serviu formar a palavra “eletricidade” e, mais tarde, para designar a partícula atômica.

A outra provavelmente tenha ocorrido quando uma agulha imantada, sobre uma superfície lisa, tenha se alinhado repetidamente na direção norte-sul, levando à primeira bússola. Mas foram necessários milênios para que, de experiência em experiência, Marconi e outros descobrissem a tecnologia da transmissão de sinais pelo campo magnético. Do genial italiano a Steve Jobs foi um instante histórico. Mas instante histórico ocupado por inúmeros pesquisadores, cada um deles abrindo caminho aos outros. Nessa combinação da intuição visionária de uns com a paciente aplicação da matemática à mecânica e à eletrônica, surgiram os computadores, os programas e a rede mundial de nossos dias. O sistema é dinâmico e, até o momento, sem obstáculos que o limitem. Tornou-se a ferramenta para as outras realizações técnicas da ciência – e das artes. Todos os ramos do conhecimento, da astronomia à biologia, da química à medicina, dependem hoje dos computadores e da rede mundial de informações que a sua existência possibilita. A vida dos homens ganhou novas dimensões, nestes últimos trinta anos e, assim, cresceram, ao mesmo tempo, suas angústias e esperanças. Tudo isso implica em inesperado e grave desafio às relações de poder, ao exercício da política.

Esse desafio não se restringe ao uso da internet na propaganda política e na mobilização popular. É muito mais profundo e mais grave, porque altera os costumes e o módulo de convivência a que estávamos acostumados, embora o rádio e a televisão já nos tenham aberto novos retábulos para a percepção da realidade. Hume já nos advertira de que o homem tem a sua identidade alterada e multiplicada, na aquisição de novos conhecimentos e novas sensações. O mesmo homem de ontem é diferente hoje. Ora, o fantástico fluxo de informações e de emoções, a que estamos submetidos, tende a uma espécie de anarquia dirigida, que a rede mundial de computadores começa a contestar, com o fortalecimento da dúvida, essa maravilhosa subversão da ordem de domínio.

Assim sendo, homens como Jobs e tantos outros criadores de sua geração, são também agentes políticos, transformadores das relações de poder, ainda que não tenham pretendido esse resultado.

O louco de Pireu

É conhecida a história (real ou fictícia) de um louco que vivia junto ao porto ateniense de Pireu. Ali, contava como fossem seus todos os navios que ancoravam e partiam. Era a “sua” certeza, contra todas as evidências.

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso está correndo o risco de ser comparado ao maníaco ateniense. Ainda agora, no Uruguai, convidado para falar sobre educação (tema de que o seu governo teria que se envergonhar, desde que não abriu uma só universidade pública) creditou aos seus dois mandatos, os êxitos obtidos por Lula. Relembre-se que Lula construiu 15 novas universidades, criou mais de 200 escolas técnicas, e abriu 150 novos campi universitários, só no setor da educação.

O político paulista também desmereceu os avanços para a integração continental da América Latina. Mas, tal como o transtornado de Pireu, ele fala aos ventos, enquanto os navios alheios, como a História, se movem.

Registre-se, no entanto, o respeito que merece sua campanha pela descriminalização do uso das drogas (ainda tímida, porque só se refere à maconha). Mas poderia ter sido realizada há uma década, quando, no exercício da presidência, teve poder para alterar as leis repressivas no Brasil. Ele, que alterou a Constituição para reeleger-se, poderia, muito bem, ter suavizado a legislação penal.

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